Acesso a Oportunidades no Plano Diretor de São Paulo

A quadra onde eu moro é próxima ao transporte público?

Efeitos da ampliação das áreas de influência dos Eixos de Estruturação da Transformação Urbana na discussão sobre a Revisão do Plano Diretor de São Paulo

Ano de publicação ou divulgação do estudo: 2023

Os eixos de adensamento

O Plano Diretor da Cidade de São Paulo que foi aprovado em 2014 (PDE-2014, Lei 16.050/2014) buscou orientar o adensamento urbano para o entorno das estações de metrô e trem e dos corredores de ônibus. Se antes a produção imobiliária ocorria de forma dispersa, a partir da nova diretriz, os novos empreendimentos imobiliários com maiores densidades foram orientados a ocorrer em localizações próximas à infraestrutura de transporte. A abrangência dos Eixos de Estruturação da Transformação Urbana (EETUs) foi definida pelas quadras inseridas na faixa de 150 metros de cada lado dos corredores de ônibus (mas inteiramente contidas na faixa de 300m), bem como no raio de 400m ao longo das estações de metrô e trem (mas internas à circunferência com raio de 600m), conforme a ilustração.

Áreas de influência dos eixos e critérios para sua definição
Fonte: gestaourbana.prefeitura.sp.gov.br

Ao direcionar a verticalização da cidade para o entorno dos eixos de transporte público, o Plano Diretor de 2014 trazia o objetivo de preservar os chamados “miolos de bairro”, que seriam regiões de baixo e média densidade construtiva. O objetivo seria estimular bairros como o ilustrado na figura abaixo, em que as maiores construções ocorrem nos eixos de mobilidade da cidade, mantendo prédios baixos e casas em regiões com menor acesso ao transporte público, onde as famílias residentes tendem a usar mais o carro.

Eixos de alta densidade e miolos de bairro de média e baixa densidade
Fonte: gestaourbana.prefeitura.sp.gov.br

Mudanças propostas

Na discussão da Revisão do Plano Diretor, que foi aprovada em 2023, o aumento da área de influência dos eixos foi amplamente discutido a partir de novas regras propostas por vereadores na Câmara Municipal. O estudo desenvolvido trouxe estimativas sobre as implicações dos novos critérios de demarcação dos eixos propostos pelo legislativo e da regra final aprovada. A discussão se centrou em três diferentes critérios: a proposta inicial do 1º substitutivo do relator; a proposta intermediária debatida na mídia logo antes da divulgação do 2º substitutivo; e a proposta final aprovada que constou no 2º substitutivo. O quadro abaixo mostra os critérios propostos nessas três propostas em comparação com a regra do PDE-2014.

PDE-2014

Quadras tocadas pelo raio de 400m e inteiramente contidas no de 600m das estações ou tocadas pela faixa de 150m e inteiramente contidas na de 300m dos corredores de ônibus

Proposta Inicial

Quadras e os lotes inteiramente contidos no raio de 1.000m das estações ou 450m dos corredores de ônibus

Proposta Intermediária

Quadras inteiramente contidas no raio de 700m das estações ou 450m dos corredores de ônibus

Proposta Aprovada

Quadras tocadas pelo raio de 700m das estações ou 400m dos corredores de ônibus

Tomando a região do entorno do Metrô Vila Madalena como exemplo, veja como os diferentes critérios impactam de forma muito diferente as quadras que podem ser demarcadas como eixos.

Plano Diretor de 2014
Proposta Inicial
Proposta Intermediária
Proposta Aprovada

Zoneamento de EETU em torno do Metrô Vila Madalena – lei de zoneamento de 2016, proposta inicial, proposta intermediária e proposta final

Importante notar que nos mapas acima, as áreas marcadas em rosa referem-se a áreas que possuem um tipo de zoneamento que não permite a ativação de eixos de adensamento¹.

Além do aumento da área de influência dos eixos, houve outra relevante alteração que foi a ativações de eixos na região chamada de Arco Tietê, que abrange quadras no entorno do Rio Tietê. No Plano Diretor de 2014, os eixos não foram demarcados no entorno das infraestruturas de transporte público presentes nesta região, bem como em outras áreas da chamada Macroarea de Estruturação da Metropolitana. Nas propostas apresentadas, esta região passou a ter eixos ativados.

¹ Para mais detalhes sobre outros critérios relativos à definição da área de abrangência dos EETUs no PDE-2014, ver art. 76 da Lei 16.050/2014 (PDE).

Implicações das alterações propostas

Em termos agregados para cidade toda, as estimativas de incremento na área de influência dos eixos a partir dos novos critérios propostos variam entre de 158% e 66,5%.

Mudanças esperadas por distrito

As mudanças em termos de área de influência dos eixos a partir das propostas variam de acordo com a região da cidade. Tais variações por distrito são significativas, conforme pode ser explorado no mapa abaixo.

Mudanças esperadas por distrito – Lei de zoneamento de 2016 x proposta aprovada

Mudanças esperadas por infraestrutura de transporte público

Também varia muito a área de influência dos eixos por infraestrutura de transporte público, conforme mostra a mapa abaixo.

Incremento de área passível de ser demarcada como EETU por estação – Lei de zoneamento de 2016 x proposta aprovada

Mudanças esperadas em função do tempo de caminhada ao transporte público

Por fim, interessa entender se as novas áreas passíveis de serem demarcadas como eixos estão distantes do transporte público quando consideramos o tempo de deslocamento a pé até as estações e corredores de ônibus.  O cálculo leva em conta o desenho das ruas e o relevo no entorno de estações ou corredores, gerando o polígono chamado de “isócrona”. A isócrona de 15 minutos a pé, por exemplo, representa a região possível de se atingir em uma caminhada nesta janela de tempo. O mapa abaixo mostra a sobreposição dos eixos das diferentes propostas e sua sobreposição com a isócrona de 15 minutos a pé do transporte público.

Área coberta por uma caminhada de 15 minutos a partir do eixo/estação de transporte

Atualmente 98% da área demarcada como eixo está a até 15 minutos do transporte de média e alta capacidade. Já na nova área de influência dos eixos aprovada no processo revisional, 77% dos novos lotes que poderão ser demarcados como eixos estão a até 15 minutos de uma estação ou corredor. Os esquemas abaixo ilustram a distribuição em função dos tempos de caminhada ao transporte público das diferentes propostas debatidas.

eixos 1.1
eixos 2.2
eixos 3.3
eixos 4.4

CONCLUSÕES

Atualmente 98% da área demarcada como eixo está a até 15 minutos do transporte de média e alta capacidade. Já na nova área de influência dos eixos aprovada no processo revisional, 77% dos novos lotes que poderão ser demarcados como eixos estão a até 15 minutos de uma estação ou corredor. Os esquemas abaixo ilustram a distribuição em função dos tempos de caminhada ao transporte público das diferentes propostas debatidas.

A análise empírica desenvolvida demonstra que a alteração aprovada para demarcação de novos eixos pode aumentar em até 160% a área em que se permite maior adensamento, acrescentando até 83,5 km² de eixos à cidade. Demonstramos que este incremento é heterogêneo espacialmente e se concentra em certos distritos. Em relação à distância ao transporte público, verificamos que 77% dos novos lotes passíveis de serem demarcados como eixos estão a menos de 15 minutos a pé de uma estação ou corredor e 22%, entre 15 minutos e 25 minutos do transporte público de média e alta capacidade. Apesar de estudos demonstrarem que uma caminhada de 25 minutos a pé é razoável para estimular o acesso ao transporte público, demonstramos que a proposta intermediária debatida durante o processo revisional poderia priorizar a ativação de novos eixos em quadras ainda mais próximas do transporte público.

O adensamento construtivo e residencial de áreas próximas ao transporte público está de acordo com as diretrizes e objetivo do atual PDE e, por tanto, a ativação de novas áreas de eixo, desde que próximas ao transporte público, não se caracterizam como retrocesso ou um “cavalo-de-pau” na atual política urbana de São Paulo. No entanto, é preciso considerar que atualmente há novas frentes de permissão de adensamento a partir da aprovação do PIU Setor Central (agosto/2022), PIU Jurubatuba (junho/2023) e PIU Vila Leopoldina (junho/2023). Ou seja, acelerar em demasia a criação eixos em áreas já consolidadas pode comprometer o desempenho de novas frentes de desenvolvimento adensado, tais como os PIUs de regiões da MEM. Sobretudo, é fundamental que a ativação de novas área de eixos se dê mediante efetivação de investimentos em infraestruturas de transporte público de média e alta capacidade (em especial corredores de ônibus) em regiões de “deserto de transporte público”, em bairros onde hoje não é possível acessar nenhum sistema de transporte estrutural em até 25 minutos a pé.